sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Uma saída para esta vala:

Para variar, a janela que traz a luz me encerra: sou apenas uma janela. Um espaço bidimensional, avidraçado, geralmente retangular; dispostas horizontal e verticalmente pela cidade, são os indivíduos da paisagem: e eu.
Eu: uma janela. Postado entre as duas realidades do mundo, parapeito do interior, observador do exterior, e nada além disso. Minha condição humana chega a ser curiosa: desfocado em prol da paisagem, os dois pontos nos quais insisto demonstram bem, em fila interminável de conclusões, minha concretude de inexistente. Meus desejos são os de uma janela: ora não fazer mais do que não atrapalhar, ora me postar como um impedimento, inconsciente de que qualquer atitude ou consciência não me fará mais que uma regular janela. Como uma janela que coloquei como personagem num conto, cuja droga para se distrair da desesperança típica de seres-janela é o sarcasmo, irresistível para se sentir um pouco mais que uma simples janela a serviço dos moradores e dos passantes.
Um sujeito com conclusões imprecipitadas, seja lá o que o leitor entender dessa palavra. Eu quero dizer mais ou menos o seguinte: não tenho símbolos pré-criativos, ou seja, não crio com vistas à uma conclusão, mas o contrário: crio por uma solução. Impremeditadas. Desta forma, o processo criativo para mim é ao mesmo tempo prazeroso e doloroso. O prazer pela auto-descoberta; a dor pelo mesmo motivo. Ao mesmo tempo é difícil e fácil: este porque não estou preso a nada; aquele porque, sem nada em que apoiar, vacilo constantemente. Corrijo: meu suporte é a minha inspiração voltada para que eu torne concreta alguma comunicação. Uma comunicação, no entanto, que não me pertence e de que tampouco me sinto proprietário. É autoral na mesma medida em que o vidro influencia na visão da paisagem. Não é realista, nem afeita ao proselitismo de observadores ou paisagens; é somente influência. O que pode parecer uma fraqueza para os espíritos viçosos, sustentados por temáticas clássicas a modernas, para mim, valado no pós-modernismo, pode ser uma nova opção, uma nova linguagem, típica de porquinhos ingênuos mas ardilosos.
São sujeitos para os quais não importa quem olha, o que se olha ou como se olha. O que importa é olhar. Preferem o verbo, enquanto os outros elementos, não sendo dispensáveis, são acessórios. E o que vier disso não é só bem vindo, mas também verdadeiro; não a verdade absoluta, às vezes até colocada em maiúscula, mas como parte da verdade maior que, já vimos, não alcançaremos por meio da linguagem, e sim por meio das pessoas que a linguagem atinge.
Sujeitos para os quais a esperança é um gato com várias vidas já mortas e que, como toda geração, tem a sua nas mãos e quer, agora, decidir o que fazer com ela: comunicamos mais do que qualquer outro em qualquer época imaginou ser possível se comunicar. E não estamos satisfeitos, claro.
Mas qual caminho queremos tomar?
Exponenciar a comunicação até que ponto?
Quais são as nossas opções e os seus respectivos limites?
Para onde queremos ir?
Vamos começar a tomar o controle do que temos ou vamos deixar o que temos nos controlar?
Minha saída - uma fatalidade, é certo: sermos janelas, com todas suas limitações e todas suas vantagens. Sermos o meio. Os quartos, as salas, as ruas e as montanhas; os moradores, os passantes e os animais já foram pisados e repisados. Existem, e ponto. Nem sujeitos nem objetos: verbos (com ou sem suas implicações bíblicas, a depender de cada um).
Se a pretensão é demais, talvez isso seja uma boa idéia de que é um caminho promissor.

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