quarta-feira, 17 de maio de 2006

Testemunho de um leitor

ela me ligou logo cedo, eu ainda nem tinha começado a tomar meu café, lido meu jornal, nada. estava lavando o rosto e corri para molhar o telefone. queria combinar algo, queria que dessa vez desse certo. a gente era assim, desses romances que darão certo, mas ainda não deram. na verdade nunca se sabe se vai ou não. ela queria, eu também. achei bom, vamos sair, sem compromisso, talvez a falta de peso ajudasse a decolar, eu sei, a metáfora, mas é isso. comecei o dia bem, pensei, pensei... fui ler o jornal, na verdade fui direto pro horóscopo, ia dizer “hoje vênus alinhado com mercúrio proporcionará bons fluidos aos seus relacionamentos”. mas não, dizia que sol, ou a lua, já não sei mais, ia atrapalhar, era pra ficar em casa praticamente. aí fudeu, pensei, não podia ser hoje, não hoje. fudeu. liguei pra ela, nem lembro, disse que não dava e acho que ela concordou rápido porque eu estava alterado, não como agora, agora estou mais calmo, quer dizer, um pouco, imagina você no meu lugar. puta merda, só comigo. desmarquei e pelo menos fiquei mais tranqüilo, até porque ficou de algum jeito marcado para o dia seguinte pelo menos. mas aí que veio a merda, saí pra tomar um café depois do trabalho, sei lá, fazer alguma coisa pra não lembrar que tinha deixado de sair com ela depois de ter pensado que daquela vez daria certo, e antes de chegar na padaria senti alguma coisa, que iria encontrá-la, não que eu soubesse que ela estava lá nem nada, mas foi uma coisa esquisita, não sei, um aperto estranho, pressentimento, sabe. não vi mais ninguém, parecia que o resto tinha escurecido e só ela estava sentada em uma mesa no meio de tudo, iluminada para mim, meu coração quase veio pela boca e saiu pulando com vergonha, e antes de eu poder pensar em voltar atrás, ela me viu. puta, sequei, acho que devo ter ficado branco. puta que pariu, acho que nunca pensei tanta coisa em tão pouco tempo. mas quando a imagem foi melhorando, ela me olhando também pálida, vi que ela estava com um outro cara. puta merda, caralho. filho da puta, filha da puta, ela, ele, eu, todo mundo. vai toma no cu, que que eu ia fazer? comprei um chiclete, dei um oi de longe, sei lá o que mais. saí, lógico! nem sabia o que pensar, o que fazer, fui parar em algum lugar, aquele filho da puta, goiaba, com aquela cara de parceiro perfeito, “ai bem te compreendo”, vai toma no cu todo mundo. saí cego, não devia ter saído, pensei, horóscopo é tiro-e-queda. mas aí olha só, voltei pra casa, não quis nada, fui tomar banho, bebi quase uma garrafa de vinho e dormi, é tudo que eu precisava. acordei mal hoje, tô um pouco mal ainda, enfim primeira coisa do dia fui ler o horóscopo, e não é que aqueles filhos da puta do jornal dão um aviso “desculpem leitores o horóscopo de hoje foi publicado ontem”. e agora?

P.S.: Se interessar, temos o testemunho em áudio...

2 comentários:

João Pedro disse...

E não interessou....

Marco disse...

pois é...