sábado, 24 de junho de 2006

XCIX - II

Otros días vendrán, será entendido
el silencio de plantas y planetas
y cuántas cosas puras pasarán!

pablo neruda



capítulo segundo – a resolução, a revelação e o encontro

lá dentro, ela padecia, e não pouco, - ou fosse mágoa pura, ou só despeito; e porque a dor que se dissimula dói mais, é mui provável que virgília padecesse em dobro do que realmente devia padecer. creio que isto é metafísica.
machado de assis

não havendo meios, e sendo eminente a lua cheia, resolvi passar um mês com meus familiares no interior. no entanto, foi-se a lua cheia e não deram coisas do amor, tanto por mim quanto por ela, que não haveria de fazer mais pelos amantes. passadas duas semanas, fechei-me no quarto para descansar e acendi uma vela simples, coloquei alguma música e perdi-me em cecília por mais de uma hora, creio. estando a vela e a imaginação ao fim, dei-me conta do que resolveria meu sofrimento. é aí que chegamos ao início da história.
aquela era a cecília que mil eisteins não revelariam, perdoem minha falta de modéstia. mas destrinçando-a como faço, fica fácil, facílimo, o que não era, creiam-me. descobri, enfim, sob a luz arquejante e moribunda daquelas velas, o segredo de cecília – ah, se aquiles soubesse, agradeceria seu calcanhar! em poucos minutos tratei de escrever-lhe uma carta e fazê-la despachar logo pela manhã. aquela é cecília lendo a carta que a remeti, posso jurar-lhes. a carta, devo dizer, era uma legítima obra-prima, e como aquiles veio-nos em metáfora, que fiquem ao chão mais mil homeros! antecipei minha volta, estava exultante, cecília nenhuma resistiria àquele golpe.

chegando à capital, liguei para cecília, dei-me um dia, marcamos um almoço em um restaurante próximo à sua casa, discreto, sim, mas escolha minha. no outro dia me aprontei e fui ao seu encontro. a bordo de um táxi que me levava ao destino, sonhei uma cecília desmascarada, uma cecília de olhos claros e brilhantes, que abriria os braços para me beijar no meio do restaurante! ah, naquele caminho, as esquinas eram bodas, os automóveis padrinhos da nossa felicidade, os ruídos, as freadas, o burburinho, fogos que estouravam ao nosso beijo! o troco da corrida foi o dízimo devido ao procurador dos céus que selou com benção nosso amor: taxistas, se tuas corridas fossem movidas do meu sentimento, seríeis ricos, riquíssimos; mas não haveria de haver amor como aquele, perdoai-me a sinceridade. pois deixemos de aforismos religiosos e vamos indo. chegando ao restaurante, achei cecília sentada de costas, virada para a janela que dava para o jardim, a claridade do sol caía-lhe no vestido branco, imagem linda, cingindo-a com uma espécie de áurea luminosa. lindíssima. dei por esquecido meu coração desavisado, indeciso entre os solavancos das emoções e a serenidade da visão, e fui ao encontro de cecília com uma bela rosa branca na mão.

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